Não era tão difícil para uma Stark adotar o preto do luto. Ali, no frio do Norte, as cores eram uma raridade. Era possível ter um manto branco se as ovelhas sobrevivessem ao inverno, e algo cinza se se arriscasse pela floresta atrás de pele. No castelo de Winterfell, é claro, as princesas poderiam ter acesso ao arco-íris dos tecidos de terras distantes, mas quase nunca o faziam.

Por isso, quando o mar levou Rei Brandon, seus filhos e filhas recorreram às peças que já possuíam em seus baús. Quase um ano depois, Lenora,  a terceira filha, já usava o tom prateado de seu estandarte, sob recomendação da irmã mais velha. Sentia muito a falta do pai, tanto que em certos dias até respirar era difícil. Contudo, as cores de suas vestes não mudariam em nada o acontecido.

Naquela manhã, levantou-se com lembranças antigas: o pai lhe ensinando arco e flecha, a mãe lhe dando seu primeiro pônei e Brandon escondendo suas bonecas. Qualquer delas deixava seus olhos negros enevoados. Nestes momentos, a simples presença de Domenic Karstark seria bem-vinda. Mas seu noivo estava longe, não em Karhold, mas em alguma fronteira do reino, defendendo seu rei como havia feito por toda sua vida militar.

A princesa havia sido apresentada ao herdeiro Karstark quando completara dezesseis anos. Se tornaram amigos quase imediatamente, mas Domenic não ousou fazer qualquer pedido até que estivesse certo de que era correspondido. O compromisso foi firmado com a bênção de seu irmão, já coroado rei, e tudo que Lenora fazia desde então era esperar.

Domenic era um dos principais generais do Norte, dedicado e ocupado, presente onde a batalha chamasse. Mas para Lenora ele era um excelente poeta, um companheiro valioso e amigo de uma vida. Amava-o, não tinha dúvida, e poderia esperar que os compromissos militares acabassem. Além disso, quando pensava em sua partida para Karhold, seu coração se enchia de apreensão. O irmão, sempre inconstante, era uma força da natureza que Lenora desejava monitorar de perto.

Não que esperasse poder exercer qualquer controle sobre ele, mas isso não queria dizer que não tentaria. A frota nortenha havia sido destruída pela insensatez do irmão, consumida pelo fogo em poucas horas. Porto Branco conseguira salvar alguns navios, impedindo-os de regressar ao Norte por várias semanas, mas isso não bastava. O trono do Norte encontrava-se vulnerável.

Domenic não emitia opiniões sobre isso, pelo menos não na presença de Lenora. Quando a noiva lhe abordava com o assunto, desconversava, sempre com uma expressão preocupada. Mas a moça não era tola, e podia sentir a tensão. Domenic queria poupá-la, mas era praticamente impossível não ter notícia da insatisfação dos súditos. A princesa tentou imaginar o que a mãe diria. A falecida rainha, Mormont de nascimento, a teria encorajado a cuidar de seu povo e não se deixar abater. Mas naquele exato momento, Lenora não sabia como fazer isso.

Foi então que teve seus devaneios interrompidos por uma criada, que bateu duas vezes antes de abrir a pesada porta de carvalho da sala de leitura, com sua respiração acelerada e um pedido de desculpas. Lenora, cujos cabelos negros caíam presos por uma trança, lhe deu um aceno de mão para que prosseguisse. --- Perdoe-me, Alteza. Mas trata-se de Lord Karstark. O Rei solicita sua presença.